fbpx

Núcleo de Cooperação
Internacional

Chile

Nome oficial: República de Chile
Sistema de governo: República democrática presidencialista unitária
Legislativo bicameral: Câmara dos Deputados (155) e Senado (50)
Área: 756.102km² 
População: 19.960.889hab (estimativa 2023)

Verbete

A via chilena para o socialismo, 50 anos depois

No dia 11 de setembro de 1973, o governo chileno foi derrubado por um golpe de Estado. O presidente chileno, Salvador Allende, eleito em 1970, morreu no dia do golpe. Teve início então uma ditadura militar que só recuaria a partir de 1988 (vitória do “no” em um plebiscito) e 1989 (eleição de Patrício Aylwin). Mas o recuo foi parcial: por exemplo, até hoje os chilenos vivem sob uma Constituição herdeira daquela aprovada em 1989. Aliás, os herdeiros do general Pinochet – a cara mais identificada com o golpe de 1973 e com a ditadura militar que veio em seguida – seguem eleitoralmente muito fortes, como se viu tanto na recente eleição presidencial (19/12/2022), quanto na eleição dos que aprovarão a “nova” Constituição (7/5/2023). No dia 11 de setembro de 2023, portanto, haverá os que comemoram e os que denunciam o golpe agora cinquentenário. E esse confronto se estenderá também ao debate de ideias, enriquecendo quantitativamente, não necessariamente qualitativamente, a já muito extensa bibliografia sobre o Chile, sobre o governo da Unidad Popular, sobre a ditadura, sobre a Concertación, sua crise e os últimos acontecimentos.

Para a esquerda latino-americana – ou seja, para aquelas forças políticas e sociais defensoras da integração regional, da soberania nacional, do bem-estar social, das liberdades democráticas, do desenvolvimento e do socialismo – Chile e Cuba, Allende e Che, são referências obrigatórias em qualquer debate estratégico. Entretanto, num certo sentido, a experiência chilena tem mais a ensinar para aquelas forças políticas que, desde 1998, conquistaram ou participam de governos nacionais em países como, por exemplo, Venezuela, Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Bolívia, Equador, Colômbia, Peru, El Salvador, Honduras. E, claro, o próprio Chile.

Ao tratar da experiência chilena, cabe em primeiro lugar render homenagem aos que tombaram, tanto resistindo ao golpe quanto lutando contra a ditadura. Cabe, também, render homenagem aos que ajudaram a construir a vitória da Unidade Popular e seus três anos de governo, que melhoraram a vida dos trabalhadores e das trabalhadoras do Chile.

Para além da homenagem aos que lutaram, ontem, pelos mesmos ideais e objetivos pelos quais lutamos hoje, cabe perguntar: a experiência histórica da Unidade Popular e do golpe pode nos ajudar a enfrentar os desafios atuais da esquerda? Nossa resposta para esta pergunta, como já foi dito anteriormente, é sim!

Já foi dito que a esquerda precisa enfrentar e superar três déficits teóricos: a análise do capitalismo do século XXI, o balanço do socialismo do século XX e o debate sobre a estratégia. É exatamente sobre este terceiro tema que a experiência chilena de 1970-1973 pode nos ajudar e muito.

A construção do socialismo supõe que a classe trabalhadora tenha poder para reorganizar a sociedade. O tema do poder, no que consiste, como construí-lo, como conquistá-lo, é portanto a questão chave em toda reflexão política.

Durante o século XIX, os socialistas enxergavam o tema do poder através do prisma oferecido pela revolução francesa: 1789, 1948, 1871 eram os paradigmas clássicos ao redor dos quais girava o imaginário de anarquistas, sindicalistas revolucionários, socialistas, social-democratas, narodniks, comunistas etc.

“As revoluções russas de 1905, fevereiro de 1917 e outubro de 1917 ofereceram um novo paradigma. E foi ao redor dele que girou, durante décadas, a reflexão política, tática e estratégica dos diferentes setores da esquerda mundial.

Os paradigmas “francês” e “russo” tinham semelhanças: o protagonismo da plebe urbana, o papel ambíguo das massas camponesas, a insurreição seguida de guerra civil e contra inimigos externos, o caráter “permanente” da revolução, o fantasma do “Termidor”.

O isolamento da Rússia soviética e a derrota das tentativas revolucionárias na Alemanha, na Romênia e na Itália, entre outras, resultarão – nos anos 1920 e 1930 – numa reflexão acerca da estratégia a adotar: a) nos países capitalistas desenvolvidos; b) nos países que não faziam parte do núcleo metropolitano central.

Tal reflexão era simultânea a outros debates, igualmente complexos, acerca da construção do socialismo na URSS, de qual devia ser a política internacional de um Estado socialista, sobre a evolução do capitalismo e do imperialismo pós-Primeira Guerra Mundial e sobre como se posicionar frente a cada vez mais provável (segunda) guerra mundial.

Os escritos de Gramsci datam deste período, embora sua influência (em variadas versões e releituras) vá se estabelecer após a Segunda Guerra, em uma situação mundial distinta daquela que serviu de base para as reflexões do comunista italiano.

De toda forma, até o final da Segunda Guerra, quando a esquerda debatia os temas do poder, predominava o paradigma da revolução russa: direção partidária, protagonismo das plebes urbanas, acúmulo de forças via lutas sindicais e políticas, duplo poder, insurreição, guerra civil, construção do socialismo. Tal “modelo” estava presente inclusive nos que defendiam as Frentes Populares e as alianças estratégicas com a burguesia, nas políticas conhecidas como etapistas.

Um novo paradigma, qualitativamente distinto, surgirá com a vitória da revolução chinesa de 1949. O papel do Partido continua destacado, mas trata-se de um partido-exército. O protagonismo é das massas camponesas, que devem “cercar as cidades”. O acúmulo de forças inclui experiências precoces de duplo poder, com libertação de territórios, formação de governos e do exército popular. A insurreição urbana, quando existe, é em apoio a ação da guerra popular prolongada.

A estes dois paradigmas (“russo” e “chinês”) soma-se um terceiro, que foi o da guerra de libertação nacional. Esta vai aparecer sob a forma anti-nazista, em países como Albânia, Iugoslávia, Grécia (neste último caso, os comunistas são derrotados pela intervenção britânica), Itália e França (nestes dois últimos casos, a política dos partidos comunistas não foi a de transformar a guerra em revolução). E vai aparecer como guerra anticolonial típica, como no caso do Vietnã, Laos, Camboja, Angola, Moçambique.

Estes três paradigmas influenciavam o debate político e estratégico da esquerda latino-americana, dos anos 1920 aos anos 1950. Há toda uma literatura a respeito, que vale a pena revisitar sempre, especialmente aquela dedicada a estudar o impacto da grande revolução mexicana, anterior à vitória da revolução socialista russa.

Uma mudança importante ocorre com a vitória da revolução cubana de 1959: uma revolução democrática anti-ditatorial, baseada na combinação entre diferentes formas de luta e organização, com ênfase na combinação entre guerrilha no campo e insurreição urbana; que uma vez vitoriosa se revela cada vez mais democrático-popular e antiimperialista; e que num certo momento converte-se em revolução socialista.

A revolução cubana, especialmente suas interpretações de tipo “foquista”, infuencia fortemente a esquerda latinoamericana nos anos 1960 e 1970. Mas, com a parcial exceção da revolução nicaraguense, as estratégicas inspiradas no exemplo cubano não são vitoriosas em nenhuma parte.

O mesmo, entretanto, deve ser dito das demais estratégias, até o final dos anos 60. Aliás, poderíamos dizer que se as revoluções são fenômenos raros, as revoluções vitoriosas são ainda mais raras e profundamente singulares: há mais constância nos motivos de derrota do que nas razões de vitória.

É neste contexto que surge a experiência do governo da Unidade Popular chilena, entre 1970 e 1973. Neste ponto há que se distinguir duas abordagens, ambas necessárias. Uma consiste no estudo da experiência histórica. Outra consiste no debate teórico acerca da estratégia proposta.

A experiência histórica da UP, os antecedentes da vitória, as vicissitudes do governo, o golpe, a ditadura que veio em seguida (com semelhanças e diferenças frente a outras ditaduras contemporâneas), as políticas neoliberais e os governos de centro-esquerda posteriores, são de uma riqueza imensa para os que fazemos parte de governos “progressistas e de esquerda” na América Latina de 2013.

Mas e do ponto de vista estritamente estratégico? Em que medida a experiência da UP constitui um paradigma positivo, útil, para construir uma nova estratégia para as esquerdas latinoamericanas?

Reformista demais para os revolucionários, revolucionária demais para os reformistas, a estratégia experimentada pela UP ficou numa espécie de limbo até 1998. Desde então, diversos governos da região passaram a tentar construir o socialismo a partir de governos produto, não de revoluções, mas de vitórias eleitorais.

Ao mesmo tempo, outros partidos socialistas tiveram que integrar em seus esquemas estratégicos o papel de governos que buscavam implementar reformas mais ou menos profundas no capitalismo. Nos dois casos, remete-se à orientação estratégia materializada no governo da UP, evidentemente a busca de construir um “caminho chileno com final feliz”.

Aqui cabe fazer uma distinção importante: para alguns setores da esquerda latinoamericana, os governos da região que são integrados e/ou dirigidos pela esquerda são funcionais ao esquema de dominação imperialista e capitalista, e/ou correspondem a um período passageiro de governos reformistas, após o qual a luta de classe voltará a condições que exigem esquemas revolucionários clássicos.

Para um segundo setor, a revolução (e, em alguns casos, o socialismo) não faz mais parte do horizonte estratégico, não cabendo diferenciar luta pelo governo e luta pelo poder.

Portanto, seja para o esquerdismo, seja para o melhorismo, a experiência da Unidade Popular chilena não tem o que nos ensinar, do ponto de vista estratégico, salvo do ponto de vista negativo.

Já para aqueles setores que continuam tendo o socialismo como objetivo estratégico, e que portanto querem que a classe trabalhadora tenha o poder necessário para construir o socialismo, o “case” da UP é estrategicamente atual: como converter a parcela de poder obtida num processo eleitoral, não apenas em melhorias concretas para a vida do povo, não apenas em reformas estruturais, mas também numa parcela de poder que permita iniciar a transição socialista?

Observando a experiência chilena, adiantamos a seguir alguns temas que serão posteriormente debatidos de maneira detalhada.

Em primeiro lugar, é preciso construir um sólido apoio nas classes trabalhadoras, o que inclui articular sob um comando estratégico único a maior parte das organizações políticas e sociais. A combinação entre luta institucional e eleitoral, ação parlamentar e de governos, luta social e construção partidária, só é virtuosa quando articulada politicamente.

Em segundo lugar, é preciso ganhar o apoio dos setores médios, dividir as classes dominantes e isolar o inimigo principal. Impedindo que ocorra o contrário: que a classe dominante isole a esquerda, ganhe o apoio dos setores médios e divida as classes trabalhadoras.

Em terceiro lugar, é preciso combinar disputa política com disputa cultural. A construção do poder necessário para iniciar uma transição socialista é indissociável da construção de outra hegemonia ideológica, cultural.

O que remete, em quarto lugar, para a necessidade de ganhar apoio nos organismos para-estatais, ou seja, organismos aparentemente privados, mas que executam funções públicas, como é o caso das igrejas, das escolas, da indústria cultural e dos meios de comunicação.

Em quinto lugar, é preciso conquistar uma maioria eleitoral que seja suficiente para ter hegemonia de esquerda nos organismos executivos e legislativos fundamentais. É insuficiente ter a presidência da República, mas sem maioria no Congresso, nem nos governos subnacionais fundamentais.

Em sexto lugar, é preciso impedir a sabotagem e a subversão provenientes dos organismos de Estado não eletivos, principalmente a alta burocracia, a Justiça e as forças armadas. Trata-se de democratizar o acesso, estabelecer controle social, mudar as doutrinas vigentes e, fundamentalmente, garantir o respeito a legalidade que advém da soberania popular. Motivo pelo qual é tão decisiva a realização de processos constituintes.

Em sétimo lugar, é preciso construir uma rede de solidariedade e proteção internacional, que reduza a ingerência externa que as metrópoles capitalistas centrais fazem sobre processos socialistas nacionais.

Em oitavo lugar, é preciso construir um programa de transformações que não seja artificial, ou seja, que parta dos problemas reais enfrentados pela sociedade e que construa soluções que atendam às necessidades das camadas populares, respeitando os níveis de consciência e a correlação de forças em cada momento, mas sempre tendo em perspectiva que cada passo gera novas necessidades, novos conflitos e novas reações, cabendo à direção política do processo se antecipar.

No caso chileno, este programa se traduziu em dois eixos fundamentais: o poder popular e a área de propriedade social. O que nos remete para um nono tema, que é como fazer a conversão de uma economia dominada pelo capitalismo privado, em uma economia capitalista hegemonizada pelo capitalismo estatal, sob condução de um governo de esquerda.

Finalmente, é preciso discutir sempre como manter a iniciativa tática, especialmente no momento em que há momentos de impasse estratégico. A experiência chilena foi derrotada por diversos motivos, mas é um erro dizer que ela teria sido inevitavelmente derrotada. E se quisermos localizar um dos motivos teóricos para a derrota, ele consiste em confundir a defesa estratégica da legalidade, com a passividade legalista frente à subversão de direita. A história poderia ter sido diferente se, frente ao Tancazo, o presidente Allende tivesse acatado as propostas do General Prats de afastar os comandantes golpistas.

O legalismo corresponde a visão estática da consciência popular. A legalidade é sempre uma mediação entre a lei (que expressa a correlação de forças passada) e a legitimidade (que expressa a correlação de forças presente). A burguesia sabe disto muito bem e não deixa de invocar o suposto apoio popular, quando lhe interessa desrespeitar a legalidade, sempre que esta está do lado da esquerda.

Foi o que ocorreu no golpe de Estado de 2016, que derrubou o governo brasileiro, então encabeçado por Dilma Rousseff, do PT. Vieram então um governo golpista, sob o qual foram realizadas eleições presidências nas quais se impediu a participação do então ex-presidente Lula. Lula assistiu da cadeia a vitória e a posse de um cavernícola. Mas pouco tempo depois, foi libertado, reconquistou o direito de disputar as eleições e venceu – por dois milhões de votos de diferença – as eleições presidenciais de 2022.

O novo governo Lula (2023-2026) experimenta dilemas estratégicos semelhantes aos de seus dois primeiros governos (2003-2006, 2007-2010), mas em condições piores do que no passado. Algo parecido ocorre com os demais governos encabeçados por partidos nacional-populares, de esquerda e progressistas na América Latina e Caribe.

Guardadas as devidas proporções, lembra o que ocorreu quando o Partido Socialista voltou à presidência do Chile, com Ricardo Lagos (2000-2006): o mundo era outro, o Chile era outro, o Partido Socialista era outro, os problemas eram maiores e menores os meios para resolvê-los. Mas, acima de tudo, era diferente a estratégia predominante na esquerda chilena. E diferente num sentido muito profundo: para amplos setores, o “horizonte” deixara de ser o socialismo e passara a ser, não apenas a socialdemocracia, mas o social-liberalismo, ou seja, a infrutífera tentativa de achar maneiras de coexistirem políticas econômicas neoliberais e a submissão à hegemonia estadounidense, com os anteriores compromissos democráticos e sociais. Na época, vale ressaltar, talvez muitos não tenham se dado conta disso.

Hoje, para tornar tudo ainda mais complexo, estamos num cenário mundial de crises e guerras, o que noutros tempos desembocou em rupturas e revoluções. Sendo assim as coisas, embora nossa poesia só possa ser extraída do futuro, segue sendo necessário voltar a estudar os fundamentos, entre os quais a “via chilena para o socialismo”.

50 anos do Golpe de Estado no Chile

Conteúdo da alternância

Partidos

Partidos integrantes do FORO DE SÃO PAULO

(N/D – página não localizada)

1. Izquierda Ciudadana (Facebook, última atualização Set. 2017. Em 2018 iniciou trâmites para sua fusão com  o Movimineto Amplio Social para formar o partido Mas Izquierda Ciudadana.​ Em 2019 Mas Izquierda Ciudadana foi dissolvido legalmente e os ex-membros da Izquierda Ciudadana se uniram ao Partido Progresista de Chile)
2. Movimiento Amplio Social (N/D. Em 2018 iniciou trâmites para sua fusão com a Izquierda Ciudadana e formar o partido Mas Izquierda Ciudadana.​ Em 2019 Mas Izquierda Ciudadana foi dissolvido legalmente e os ex-membros da Izquierda Ciudadana se uniram ao Partido Progresista de Chile)
3. Movimiento de Izquierda Revolucionaria
4. Partido Comunista de Chile
5. Partido Humanista
6. Partido Socialista
7. Movimiento del Socialismo Allendista
8. Revolución Democrática
9. Partido Igualdad
10. Poder Ciudadano (N/D. Fundado en 2015, foi um dos partidos fundadores da Frente Ampla. Em 2019 após fundir-se com a Izquierda Autónoma o partido passou a integrar Comunes).​
11. Partido Progresista de Chile
12. Izquierda Libertaria (Facebook)

Links úteis

Archivo Chile
(página  do Centro de Estudios “Miguel Enríquez”. (CEME), desatualizada, mas com acervo interessante sobre a esquerda e movimentos sociais chilenos e da AL)

Arquivo Histórico da revista de esquerda chilena Punto Final

Central Unitária dos Trabalhadores do Chile (CUT)

Revueltas. Revista Chilena de Historia Social Popular

Fundación Progresa

Vídeos da Fundação Perseu Abramo sobre Chile

Curso da ELAHP

Páginas do contrato firmado entre a Fundação Perseu Abramo e Escola Latino-americana de História e Política

Núcleo de Cooperação
Internacional