A volta do debate marxista da “dependência”

Gustavo Codas

A Editora Expressão Popular acaba de lançar o livro Teoria Marxista da Dependência. Problemas e categorias – uma visão histórica (disponível aqui), de Mathias Seibel Luce, professsor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Trata-se da mais ambiciosa tentativa de recolocar no Brasil a discussão sobre dependência e desenvolvimento, para analisar a história recente do país, utilizando os conceitos elaborados por Rui Mauro Marini (1932-97), Theotonio dos Santos (1936-2018) e Vania Bambirra (1940-2015).

A “teoria marxista da dependência” tem uma história singular. Teve intensa participação de intelectuais brasileiros como os mencionados e grande difusão, entre a segunda metade dos anos 1960 e a década seguinte, em toda América Latina. Porém, dos anos 1980 em diante, no Brasil praticamente desapareceu das prateleiras das livrarias, dos currículos acadêmicos e da elaboração programática das esquerdas.

Parecia que o ataque de FHC contra Marini, nos anos 1970, tinha vencido o debate teórico-político: “A tese que desejo indicar (…) insiste em que o novo caráter da dependência (…) não colide com o desenvolvimento econômico das economias dependentes” (pág.383 do livro “América Latina. Ensaios de interpretação econômica”, coordenado por José Serra, 1976, Rio de Janeiro, Ed. Paz e Terra). Ou seja, se o imperialismo não impede o desenvolvimento da periferia, para que o aintiimperialismo?

O governo FHC (1995-2002) foi a demostração prática da falácia dessa fórmula. Porém, nem isso trouxe a teoria marxista sobre a dependência de volta ao debate acadêmico. Foi só sob os governos Lula que o tema voltou gradualmente a ser de interesse acadêmico, editorial e militante no Brasil.

Deve-se saudar esse retorno. Por que não teria sido parte dos impasses da experiência dos governos petistas, que teve um desfecho trágico em 2016, não atentar para temas colocados pela teoria marxista da dependência? É uma das tarefas pendentes da intelectualidade militante no Brasil e na América Latina repensar a experiência dos governos progressistas partindo de categorias analíticas que vão além dos problemas da gestão da política econômica e social de curto prazo e das táticas político eleitorais. É preciso entender as estruturas e dinâmicas profundas da sociedade em um processo de transformação. Voltar à “teoria marxista da dependência” e atualizá-la será necessariamente parte desse processo de elaboração.

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